Vésperas do Incompreendido
Poemas | Carlos Roberto RibeiroPublicado em 27 de Outubro de 2024 ás 11h 39min
No início, o sopro, um tempo de aragem intocada, cujo curso, a quem pertence? De ventos não há herdeiros, nem a matéria lhes conhece o peso.
E na quietude deste vazio pulsante,
repousa o traço do que nunca chega a ser,
o interstício da intenção e do olvido,
como o último pensamento
de uma estrela a renunciar o céu.
Mas ao se despedir de uma face,
o espelho desenha no vidro a sombra de quem olha
e, no reflexo onde jazemos,
os olhos não têm fim,
miram-se adiante, em um vão perene
de ausências que respiram.
O que é o eco, senão o som daquilo que cede?
A alma que se esvazia é grão à deriva
na constância de si mesma,
um segredo que se conta
e volta a silenciar.
Apreende-se assim o irrecuperável —
tão próximo quanto a mão que se afasta,
tão alheio quanto o nome que se desconhece,
posto que na trama do transitório,
todo fim desata um início.