Stand Up Comedy do Horror
Poemas | Carlos Roberto RibeiroPublicado em 06 de Junho de 2025 ás 20h 28min
No centro do palco...
um microfone.
Sozinho.
Erguido como lança num ritual moderno.
Ali...
promete-se riso fácil.
Alívio breve.
Mas por trás da cortina...
algo se contorce.
É Stand Up Comedy.
E dizem...
que ali tudo é permitido.
Dizem...
que é “só piada”.
Que é só texto.
Só cena.
Só “humor”.
Mas quando o riso...
é à custa de quem sangra,
o que sobra
não é piada.
É punhal.
Riem da velhice.
Como se o tempo não os tocasse.
Riem dos corpos que não cabem.
Como se fome fosse comédia.
Riem da cor da pele.
Do andar trêmulo.
Da fala arrastada.
Riem...
de quem vive com HIV.
Riem de crianças violentadas.
Riem de pessoas com deficiência.
Riem...
como se a dor alheia
fosse entretenimento.
Mas é só Stand Up, né?
Só uma piada.
Há quem ria.
E há quem silencie.
Com os olhos baixos
e o peito esmagado.
Pagando ingresso...
pra ser ferido.
Isso não é liberdade de expressão.
É falta de compaixão.
Porque o palco pode ser altar...
mas também pode ser cadafalso.
E o microfone?
O microfone pode ser arma.
Não é censura.
É ética.
É responsabilidade.
A arte nunca precisou humilhar...
pra ser potente.
Nunca precisou zombar dos fracos
pra ser forte.
Stand Up não é trincheira
pra opressor fazer festa.
É — ou deveria ser —
espaço de inteligência,
de crítica,
de ruptura.
Se o texto for pedra...
e o riso for munição...
então...
isso não é arte.
É só mais um espetáculo
de exclusão.
Com plateia paga
e risos programados.
Quando o show acabar...
o que foi dito
vai ecoar.
Nas ruas.
Nos corpos.
E... com sorte,
ou com justiça...
vai voltar pra ser cobrado.
Porque todo riso tem origem.
E todo silêncio...
tem memória.
E mesmo no escuro...
de um teatro...
ninguém ri impunemente.