Pros Meus Sonhos Vazios
Poemas | Antologia Nacional Família Literária: Versos que Iluminam Caminhos | JOSETI GOMESPublicado em 02 de Novembro de 2025 ás 22h 44min
PROS MEUS SONHOS VAZIOS
Joseti Gomes
Hoje, bem cedo,
fiz minha mala e voltei.
Cheguei na estação do tempo
que há muito esperava tranquila
entre o passado e o talvez...
Embarquei sem pressa,
deixando tudo pra trás,
pois esta viagem de volta
fora adiada demais.
O verde vivo dos campos,
foi logo se desbotando.
Uma criança me olhando,
sentada à minha frente,
muita coisa perguntava,
sem nada dizer pra mim...
Busquei de pronto a janela.
A vida corria lá fora
revelando a minha história!
Mostrava o rio de águas claras
onde pesquei lambaris.
A fumaça pelos ares,
do meu trenzinho de lata,
que carregava com ela
meus brinquedos de piá.
Vi a mãe que eu tanto amava,
me chamando para o banho,
antes de pôr o jantar.
Vi tudo passar correndo...
Vi meu cusco de olhar triste,
tal o dia em que parti.
Vi galinhas no terreiro,
ciscando naquela sina
de procurar algo perdido,
sempre pertinho de si.
Por que eu fui buscar longe,
se o meu lugar era ali?
O trem corria depressa.
A janela me traindo,
já não mostrava lá fora,
enquanto a chuva de manso
me pegava distraído,
escorrendo pelo vidro,
deslizava no meu rosto.
Senti culpa, remorsos...
Senti gosto de saudade...
Chorar não adiantava!
A criança me olhava.
Da sua boca serrada,
saiam tantas palavras
que eu não queria escutar.
Falou da terra macia que,
um dia, pisei descalço.
Falou dos banhos de sanga,
das artes da gurizada.
Falou da pipa de água,
que eu enchia assoviando.
Falou dos ventos soprando,
sob a quincha dos galpões.
Falou também das caçadas.
Das tardes de mato adentro,
saboreando pitangas.
Eu me via homem feito!
A mãe não podia ralhar
e o pai, jamais saberia
que eu subia tão alto
naqueles galhos benditos,
que me faziam voar.
Assim, eu peguei carona
nas asas desses recuerdos...
De repente me dei conta
que a criança adormecera.
Tinha um ar angelical.
E despertava sorrindo,
bem diferente de outrora,
já não mais inquisidora.
A noite vinha a galope.
Pirilampos em romaria,
fazendo festa pra lua
que despontava tão grande.
Clara, linda, nua
como há muito eu já não via...
Era a estação do passado.
Criei coragem, desci.
E o trem seguiu apitando.
Ficavam pra trás, nós dois:
A criança sem um nome...
E eu, “um velho”... que,
um dia, partiu pra longe
na ilusão que engana a gente,
que pensa que é preciso
ir-se embora ainda jovem,
para aprender a ser homem.
Mas eu estava de volta.
Nas mãos, uns pilas trocados
pras compras da minha mãe.
Com os meus olhos confusos,
me olhando de calças curtas,
saí correndo pra venda
onde eu comprava os avios.
De chinelinhos de dedo
voltei ligeiro pra casa.
Eu era a criança, com asas,
que foi me buscar sozinha,
num futuro tão distante,
cheio de sonhos, vazios!