O chão quente sob meus pés era uma promessa de liberdade. Corria descalço pelo quintal, sentindo a terra se moldar contra minha pele como se quisesse guardar minha marca. O vento soprava forte, espalhando folhas e risos, e cada grão de areia grudado nos meus tornozelos era um vestígio de uma tarde que não queria acabar.

 

Brinquedos? Nunca fizeram falta. Uma vara virava espada, uma folha grande se tornava coroa, e as nuvens desenhavam mundos onde eu podia ser quem quisesse. O tempo não existia—não havia urgência, apenas a imensidão de horas que se dissolviam entre brincadeiras e histórias inventadas.

 

Quando a chuva chegava, não corríamos para dentro. Ficávamos ali, braços abertos, acolhendo cada gota como se fossem fragmentos de céu caindo para nos tocar. A água lavava a poeira dos pés, o cheiro da terra molhada inundava o ar, e o frio que escorria pelo rosto era um lembrete de que estávamos vivos, intensamente presentes naquele instante.

 

A inocência morava nesses momentos, nas tardes sem fim, nos pés descalços, no vento que levava nossas vozes para longe. E mesmo agora, tantos anos depois, a lembrança desses dias continua soprando dentro de mim—leve, infinita, como o próprio vento.

Livro: FRAGMENTOS DO PASSADO

Comentários

Olá! Utilizamos cookies para oferecer melhor experiência, melhorar o desempenho, analisar como você interage em nosso site e personalizar conteúdo. Ao utilizar este site, você concorda com o uso de cookies.