Omnis Cronos, a máquina do tempo

Contos | Romeu Donatti
Publicado em 11 de Junho de 2024 ás 20h 05min

Eram 10:00 horas. O sino para o término do recreio ecoou pelo pátio. Rapidamente o burburinho dos alunos alinhando-se para retornar à sala de aula tomou conta do local. Eu teria aula de inglês com o professor Roberto. As duas últimas aulas eram dele. O teacher Roberto era exigente e pontual. Andava sempre com sua mochila abarrotada e seu aparelho de som, carinhosamente, apelidado por ele mesmo, de “marmitinha”, em razão de seu formato arredondado. Eu era fã dele e de suas aulas, e, ficava sempre, aguardando ansiosamente, o que sairia daquela mochila e daquelas aulas recheadas de surpresas.

Naquele dia, o teacher não fez a chamada, como de costume. Enquanto os alunos, meus colegas, ainda se acomodavam em suas carteiras, eu, já sentado, observei que ele ia distribuindo de carteira em carteira, uma folha de papel. “O que será que teremos hoje?” Indaguei-me curioso.

Ao receber a minha, agradeci com um sorriso e um afável “good morning, teacher”, ao qual fui correspondido. E imediatamente, pus-me a lê-la.

Antes de terminar minha leitura silenciosa, fui interrompido pela voz grave do professor. “Good morning, everyone! How are you doing today?” perguntou-nos com sua habitual cordialidade. E, novamente, antes mesmo que todos pudessem adequadamente respondê-lo, ele continuou a falar, entusiasticamente.

“Uma vez que no capítulo do nosso livro que iniciaremos na aula da próxima semana, abordaremos um conteúdo com temática tecnológica, gostaria de propor uma atividade de escrita a vocês”. Na sala, ouviu-se um “ahhhhhh” de desapontamento quase uníssono. Porém, não era o meu caso, pois, dentre as minhas habilidades e uma de minhas destacadas características como estudante, estava a escrita. E eu a desenvolvia com capricho e paixão, desde os meus primeiros anos escolares.

Ao retomarmos juntos a leitura da proposta de escrita, acompanhada de muitas dúvidas dos colegas, bem como das explicações do professor, eu já havia embarcado em minha história.

A atividade consistia na seguinte tarefa: “Imagine que uma time machine foi inventada e você será a primeira pessoa a experimentá-la depois de todos os testes necessários que comprovam o seu perfeito funcionamento já terem sido realizados. A viagem inaugural pelo tempo levará você ao passado, mais precisamente a 1921. E você se encontrará com um antepassado seu...”

Instantaneamente, lembrei-me daquele quadro antigo, com moldura dourada que enfeitava a sala-de-estar de nossa casa. Nele, via-se meu bisavô materno, Francesco, em uma foto em preto e branco e amarelada pelo tempo, sentado em uma cadeira de corda de sisal, com um garoto ao colo, ao lado de minha bisavó Ângela e seus outros 9 filhos distribuídos pela cena, acomodados sob a sombra de um frondoso cinamomo. Eles viviam em uma cidade pequenina e charmosa, chamada Serra Fina, no interior do Rio Grande do Sul.

Minha mãe sempre nos contava (a mim e meus irmãos), milhares de histórias dele, principalmente sobre caçadas e pescarias, nas quais suas virtudes de exímio piadista eram sempre exaltadas. Aquela imagem tão significativa na parede da sala serviu-me de gatilho para a escrita do meu texto.

“Ansioso, com o coração quase na boca, às 6:00 horas do dia 20 de julho de 2021, partiu com destino à capital gaúcha, Porto Alegre, o micro-ônibus que nos levaria ao Centro de Pesquisas Avançadas em Estudos Físicos e Nucleares (CENPEAEFINU) da Universidade Federal da Grande Porto Alegre (UFG-POÁ) para conhecermos de perto uma das descobertas científicas mais memoráveis das últimas décadas, a famosa Máquina do Tempo de Omnis Cronos, como fora batizada por seus criadores.

A viagem até a capital, por si só, era um acontecimento inesquecível, para se registrar na memória, em fotos e vídeos, para contar, incansavelmente, aos amigos, colegas e descendentes. Um evento para a posteridade! Deixar Serra Fina, como um dos dez alunos selecionados em todo o estado para visitar tais instalações, já fazia de mim, um felizardo estudante. A viagem até lá levaria aproximadamente três horas.

Como é comum em quase todas as excursões escolares (e na nossa não foi diferente) visitamos alguns pontos turísticos. E nosso passeio tornou-se ainda mais marcante. Felizes e afoitos, seguíamos todos no micro-ônibus (eu, uma colega de uma cidade vizinha, Valquíria, minha professora de Ciências, Clarinha, os coordenadores da escola, professores Regina e Irineu, a diretora, professora Eva, além de dois pais – Ivo e Claudir – como monitores e o motorista – Senhor Amadeu) formando a comitiva que se dirigia à POÁ. Eu não cabia em mim, tamanho era o meu contentamento!!!

Já em solo porto-alegrense, tudo era novidade. Os arranha-céus, o Guaíba banhando a cidade, as grandes pontes, a Estátua do Laçador, a Arena do Grêmio – meu time do coração –; todas as imagens que eu só conhecia pelos livros, televisão ou celular, desfilavam majestosas diante de meus olhos curiosos, e por vezes, incrédulos. Mas era verdade, era tudo verdade!

Quando, finalmente, o micro-ônibus entrou pelos portões gigantescos da UFG-POÁ, não me contive, e, em pranto eufórico, gritei ensandecido.

Descemos do ônibus e fomos recebidos por uma equipe da universidade, que logo nos encaminhou para um tour pelo campus. “Como tudo isso é incrível!”, pensei comigo mesmo ao flertar com uma verdadeira cidade dentro da universidade.

A grandiosidade de tudo que se desvelava fortaleceu minha vontade de ser cientista (fomentada, intimamente, desde pequenino). A ideia de poder, através do estudo e do conhecimento científico, contribuir para auxiliar outras pessoas me fascinava. Eu realmente sabia da importância e da necessidade de se fazer ciência com ética e seriedade.

Depois de quase três horas de viagem, mais três de descobertas, fomos almoçar no restaurante universitário. Uma hora nos separava da oportunidade de, finalmente, conhecer de perto, a Omnis Cronos.

Mais tarde, ao entrar, finalmente(!), na CENPEAEFINU meu coração acelerou de tal modo que precisei sentar-me e beber quase uma garrafa inteira de água a fim de recompor-me para continuar a excursão. Fui prontamente atendido pela equipe escolar, bem como pelos funcionários da universidade, que preocupados, tentavam gentilmente, acalmar-me da euforia.

A Omnis Cronos assemelhava-se a um grande elevador, com botões, teclas e luzes que corroboravam a magnitude científica de tal descoberta. Tratava-se de um experimento revolucionário, possível graças aos cientistas visionários que a haviam criado.

Fui o primeiro estudante selecionado para testá-la. Paramentei-me de acordo com as medidas de segurança exigidas para tal fim. Posicionei-me no interior da Omnis Cronos; atentamente, ouvi todas as instruções, orientações e recomendações da equipe técnica. “Lembre-se, Romeu”, disse o supervisor geral do projeto, Doutor Herrera, “você terá três horas para voltar, caso contrário, ficará aprisionado para sempre no passado.”

Essas últimas palavras soaram-me estranhas e um calafrio intermitente percorreu meu corpo, dos pés à cabeça. Repentinamente, senti um nó na garganta, a boca seca teimava em falar, mas o som da minha voz não saía. O botão verde à minha frente, hipnotizava-me. Pronto!

Comecei a sentir cheiros diferentes... Ar fresco, fruta madura, capim verde, terra levemente molhada. Fui caminhando, vagarosamente, por uma estrada estreita, de terra e cascalho. A paisagem era deslumbrante. Algo me fez perceber aquele lugar como familiar; apertei o passo, corri. Em poucos instantes, à minha direita, reconheci o famoso cinamomo da fotografia. Um misto de choro e alegria tomou conta de mim. Era o sítio do biso Francesco!

Antes de me aproximar, eu precisava me recompor, pensar em algo sensato para dizer, afinal, como eu explicaria quem eu era, o que havia acontecido, o que fazia ali?

Lembre-se “você tem apenas três horas...”. Essa frase martelava meu pensamento!

A casa era exatamente igual à que eu construíra em minha mente, segundo a descrição detalhista fornecida por mamãe. Fui chegando mais perto, mais perto e, inesperadamente, um cachorro aproximou-se correndo. A princípio, assustei-me, mas logo me dei conta de sua mansidão e vontade de conhecer um novo amigo. A balbúrdia feita pelo cão, alertou alguém de dentro da casa, que prontamente ralhou pela janela: “saia pra lá, Bartolomeu! Deixa o menino em paz!” dizia uma voz feminina quase rouca.

“É a bisa”, pensei com meus botões. “Oh de casa?!” emendei.

“Boas tardes, rapazinho. O que fazes aqui? Nunca te vi pelas imediações”.

“Boa tarde, bi..., ops, bondosa senhora, meu nome é Romeu. Moro na cidade vizinha e estou aqui para realizar uma tarefa escolar. Será que poderiam me ajudar?” Foi o que consegui pensar, pois estava muito apreensivo.

“Tarefa escolar? De que se trata? Estamos apenas eu e meu esposo em casa. Nossos filhos não estão aqui e não somos muito estudados”, disse ela em tom delicado.

“Ah, não se preocupe, são apenas algumas perguntas sobre a vida no campo, tenho certeza que a ajuda dos senhores será muito bem-vinda.”

“Está bem, entre meu filho, saía desse sol que queimará sua moleira. Vou lhe buscar um copo d’água fresca na moringa. Sente-se aqui”.

“Obrigado”, disse eu ao entrar e colocar-me de pé ao lado de uma cadeira que parecia ser a mesma da foto. Ressabiado, sentei-me. Em seguida a bisa retornou e estendeu-me o copo d’água e emendou nova pergunta.

“Como se chama, belo rapazinho?”

“Romeu”, respondi prontamente. “Meu nome é Romeu”.

“Ora, ora. Que belo nome! Combina perfeitamente com você!”

Agradeci com um tímido sorriso.

Naquele instante senti uma mão pesada tocar meu ombro, virei-me, e ali, bem atrás de mim, surgira o biso, vindo silenciosamente de outro cômodo da casa. Ficou olhando para mim fixamente, como se me conhecesse. A impressão que eu tinha era de que tentava encontrar em meu rosto algo que lhe pudesse informar quem eu era.

Eu imediatamente o reconheci. Seu rosto arredondado e simpático, com traços marcantes e um proeminente maxilar era muito semelhante ao do retrato na parede de casa. Pensei em correr para lhe abraçar. Contive-me, afinal, eu era um estranho para eles.

“Boas tardes, guri!” – uma voz gutural ecoou pela antessala.

A bisa Ângela rapidamente fez questão de informar o esposo, fornecendo-lhe todos os detalhes que eu lhe contara.

“Tarefa do Grupo Escolar? São poucos os garotos da redondeza que estudam e nunca lhe vi por essas bandas”, ponderou o biso.

“Pois é... Vim da cidade vizinha, especialmente para isso. Nosso professor nos orientou a falar com pessoas completamente desconhecidas, e, se possível, de outros lugares. Ele comentou que isso é bem importante para uma tarefa mais complexa que teremos no próximo semestre”.

“Você tem apenas três horas...”. Tum, tum, tum. Essas palavras ressoavam dentro de mim. Tentei agilizar as coisas.

“Os senhores podem me ajudar? É bem simples. São apenas algumas perguntas que eu devo fazer e anotar as respostas na minha caderneta”.

A bisa, docemente, nos interrompeu. “Vá lá, homem. Ajude o rapazinho Romeu. Deixarei vocês à vontade e vou ver como está minha panela no fogo”. Virou-se para mim e perguntou-me: “você gosta de polenta e frango em molho? É o que teremos hoje para o almoço, e sempre há lugar à nossa mesa. Você será nosso convidado! E não aceito “não” como resposta; com licença”. E saiu ajeitando o avental de chitão sobre sua saia.

“Pois bem. Sente-se, meu rapaz. Como é mesmo seu nome?”

“Romeu”.

“É bem verdade, Romeu. Romeu que nome curioso, não?”

Tentei dizer algo, mas a imagem daquele homem grande, bonachão e de olhos curiosos, me impedia.

“Podemos começar, senhor?” – perguntei-lhe pensando no tempo que escorria. Estava sem relógio e na “viagem” eu estava vestido como um garoto daquela época. Eu percebi que ele tinha um relógio de bolso, mas não queria perguntar-lhe as horas com receio de parecer rude ou indelicado.

“Sim, estou à disposição” – asseverou ele.

“Senhor Francesco, quais são as maiores vantagens e desvantagens que vocês têm na vida no campo?”

Um largo sorriso, acompanhado de uma ruidosa gargalhada ecoou pelo ambiente.

“Desvantagens?” – questionou – “não há nenhuma, não. A vida aqui no sítio é a melhor do mundo! Tenho uma esposa maravilhosa, dadivosa, companheira e boa mãe, que conheci logo após ter saído do exército, em uma festa da comunidade. Com ela, segui todos os conformes; namoramos, pedi-a em casamento e meu falecido pai nos deu esse pedacinho de chão, e eu vim para cá com ela. E assim iniciamos nossa vida juntos. Aqui plantamos e colhemos de tudo. Temos bastante trabalho, sim, é verdade. Mas é o trabalho que nos enobrece. No início foi mais difícil, plantamos hortaliças e frutas e sofremos bastante com as constantes geadas. Houve até um ano que deu neve por aqui. Bahhh, aquele ano foi terrível!”

Eu me deleitava com aquela narração que misturada ao cheiro do frango na panela vagueando pelo ar construíam o cenário perfeito emoldurado naquela antiga foto.

Embora eu morasse na cidade, a minha diversão mais genuína acontecia no período das férias quando eu fazia minha mala e junto com três primos e duas primas viajávamos até a fazenda de nosso Tio Rubão. Lá, andávamos a cavalo, corríamos pelo pasto e pelos parreirais, tomávamos banho no açude com boia de pneu, brincávamos no balanço pendurado no cinamomo até anoitecer. Isso sim eram férias de respeito! Isso sim era diversão! Que coisa boa!

“Está me ouvindo, rapaz?” – interpelou-me quase que ofendido.

Acho que percebera que eu estava completamente absorto em meus pensamentos.

“Sim, claro. Desculpe. Continue, senhor”.

E o biso prosseguiu... “Você viu nossos tomates? E aqueles morangos graúdos? Depois daquele ano em que nevou, tudo começou a melhorar. Logo vieram os filhos que hoje já me ajudam bastante na lida no campo e a energia elétrica foi instalada há dois meses e...”

“Não se esqueça, você tem apenas três horas”. Que lembrança malograda! Estava refém do tempo! Eu queria permanecer ali, paradinho, apenas ouvindo o biso, e as intervenções da bisa, que volta e meia se afastava da cozinha para “participar” da conversa e nos trazer biscoitos e frutas para merendar. Mas...

E o biso continuou, creio pelos meus cálculos, que por cerca de mais de trinta minutos a descrever as maravilhas da vida simples, porém gratificante, na zona rural. Falou-me da colheita dos pêssegos e da preparação das geleias e chimias, da matança dos porcos – tarefa exaustiva e prazerosa – que juntava os vizinhos mais próximos em um dia inteiro de trabalho e diversão, regado a torresmo, costelinha suína frita, acompanhada de polenta e salada de almeirão; ensinou-me as mais apuradas técnicas para produzir os mais saborosos salames; contou-me de suas proezas ao caçar e pescar com os amigos e das traquinagens que sempre aprontava com os companheiros.

“No entanto, Romeu, uma de minhas maiores alegrias é poder estar em casa com minha querida Ângela e meus filhos e fazer aquele churrasquinho no domingo, preparado e assado no espeto de madeira”. Nesse momento, percebi a voz do biso embargada, uma pequena lágrima se acumulava no canto do olho direito e teimava em rolar pelas maçãs. Parei, esperei um instante. E, sem hesitar, abracei-o. Foi um dos abraços mais acolhedores que já recebera. Ele estranhou um pouco, mas em seguida, retribuiu, como quem abraçara um filho.

“Senhor, Francesco, desculpe. Ao ouvi-lo lembrei do meu Tio Rubão e não pude me controlar. Tenho somente mais uma pergunta, depois não tomarei mais seu tempo e o senhor poderá voltar às suas atividades” – disse receoso pois o tempo se esvaia impiedoso.

“Meu caro rapaz, não se avexe! Pela manhã já não tenho mais nada a fazer e não se esqueça de que você é nosso convidado; Ângela, a polenta e o frango nos aguardam”. Alertou-me, faceiro.

“Ah, sim, verdade”, tentei disfarçar. “E qual é o segredo da vida? O que precisamos fazer para bem viver?”

“É você, rapazinho, ou seu professor que quer saber a resposta?” Inquiriu-me com certa desconfiança e docilidade. “Não há segredo, jovem Romeu. O mais importante é...” E de repente...”

Trimmmmmmmmmm!!! Retumbou absurdamente alto, o sino para o término da aula. Deixei cair minha caneta. Olhei para os lados, meus amigos se apressavam em guardar seus materiais nas mochilas, outros já deixavam a sala. O teacher Roberto apagava a lousa, gesticulava e falava, simultaneamente: “os estudantes que não terminaram sua composição, please, tragam-na pronta na próxima aula, pois vamos conhecer suas histórias e escrevê-las em inglês”.

Fiquei feliz, pois a minha estava quase pronta. Lamentei a falta de tempo para concluí-la. No entanto, ao fechar meu caderno, percebi que eu mal começara, havia apenas quatro linhas escritas. Atordoado e incrédulo, dei-me conta de que eu adormecera na carteira, e a história que eu escrevera, não passara de um sonho.

Envergonhado, comecei a recolher minhas coisas, quando de soslaio, observei a aproximação de alguém. Era o professor Roberto.

Shame on you, Romeu. Eu esperava mais de você. O que se passou?” – indagou-me com visível desapontamento.

Sorry, teacher” – foi tudo que consegui lhe responder. Terminei de recolher apressadamente meus pertences, e corri pela sala em direção à porta, fugindo do olhar escrutinador de meu professor, por entre as carteiras.

Naquele dia, nem esperei, como de costume, meu amigo e vizinho, Tarso. Dirigi-me para casa sozinho, faminto e remoendo toda aquela história. Tudo parecera tão real! “Terá sido mesmo um sonho?” Interrogava-me, desconsolado. E bem na hora em que o biso me contaria o segredo da vida... Ainda sentia o aroma do frango e da polenta pelo ar. Parecia que os braços do biso ainda estavam envoltos em mim, naquele abraço tão espontâneo e indescritível.

“E o que será que ele iria me dizer? Quais foram suas últimas palavras ditas?” Pensei, repensei e lembrei: “o mais importante é...”

Ao chegar em casa o almoço já estava posto à mesa. Era arroz de carreteiro. E eu adorava arroz de carreteiro com bastante queijo ralado. Comi muito! Mamãe, feliz, olhava-me com carinho. Não mencionei nada sobre o que se passara na escola.

Após o almoço, ajudei mamãe com a louça, alimentei minhas cadelinhas Meg e Mel e fui até meu quarto. Lá, retirei meu uniforme, coloquei a mochila sobre a escrivaninha e deitei-me na cama olhando para o teto. Adormeci...

“Você terá apenas três horas, Romeu...”. Tic-tac, tic-tac, tic-tac...

“Rapazinho, sente-se; sirva-se, ou a polenta esfriará”. Olhei para o lado e vi o biso e a bisa, sorridentes, esperando para que eu me servisse. O perfume da comida atraíra Bartolomeu, que esperava espevitado por algo, junto a meus pés.

“O mais importante, Romeu, é viver a vida com o que temos, com quem amamos, sem pressa, apenas desfrutando o momento. O tempo passará, inexoravelmente, e as boas coisas que fizermos e as melhores lembranças, sempre estarão conosco.”

Acordei. Que cochilo mais gostoso! Observei a minha volta, procurando explicações. Levantei-me e fui até a janela, olhei pela vidraça e percebi a chuva fina que caía no quintal molhando os bem-te-vis que brincavam na calçada. No quarto, ainda pairava o calor do abraço aconchegante do biso.

Livro: O que quero da vida

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