O perder do nada

Poemas | 2023/4 Antologia Pedras que se encontram | Darcília Lebron
Publicado em 05 de Julho de 2023 ás 23h 07min

Nada tenho!

O que posso perder?

Não tenho as horas raras,

os amores antigos.

 

Só não posso padecer do mau maior:

me perder em mim,

Como um peão rodopiante -

brinquedo de madeira, acionado por uma cordinha.

 

...girar em torno de mim mesmo, em forma de redemoinho

até cair de tonto, desequilibrado.

 

Deus me livre de medonha sorte!

Seria preferível a morte?

Mas se nada tenho,

O que temo?

 

Apesar dos dias tortos e incertos como labirintos,

já não me amedronta seguir em frente.

Mesmo com o desconhecido.

 

Sigo; hora destemido, hora temeroso,

à mercê de minhas escolhas,

feitas de papel marche.

 

 

Sou responsável, porque tremer?

Por causa do bicho-papão debaixo do colchão?

...ou do boi da cara preta,

que não entende que não tenho mais medo de careta,

e gosto de tomar vaca-preta da Sorveteria do Pelé?

 

Temo sim; mas sigo em frente.

Nada de parar, se ainda não terminou a viagem.

Só se for pra reabastecer, checar ou refazer a rota.

 

Temo, tremo

sigo em frente. 

Nada tenho

A perder

Perverter

O excesso

Conta gotas

Reverso

 

Avesso às formalidades encaniçadas.

 

Posso andar vadio entre as gentes

Trombar com o vento e andar com a chuva

Chutar a lama da rua

Dar risada de sandice.

 

Cara envernizada.

Nada tenho a perder!

Temo, mas sigo em frente!

 

Darcília Lebron, 2023

 

 

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