O mito de “dar certo” nos relacionamentos
Ensaios | Carlos OnkowePublicado em 04 de Setembro de 2025 ás 08h 37min
Não existe essa ideia simplista de que um relacionamento “dá certo” ou “não dá certo”. Relacionamentos não são produtos de fábrica que saem da linha de montagem para cumprir uma expectativa preestabelecida de sucesso. Eles são processos dinâmicos, atravessados por afetos, histórias de vida, subjetividades, valores e contextos sociais. O que verdadeiramente existe é a questão de funcionalidade: até que ponto a relação funciona para os dois envolvidos, até quando ela oferece sentido, crescimento, segurança, afeto, respeito e desejo.
Quando falamos em funcionalidade, não estamos falando de perfeição, mas de equilíbrio. Uma relação funcional não é aquela que não apresenta conflitos, mas aquela em que os conflitos podem ser elaborados, conversados e superados de maneira que fortaleça o vínculo. Por outro lado, a não-funcionalidade surge quando a relação se torna um espaço de desgaste contínuo, de ausência de escuta, de violência (seja simbólica, emocional ou física) ou simplesmente quando deixa de haver afinidade e partilha de projetos.
Nesse sentido, a chamada “não funcionabilidade” é, de fato, a causa central do término. Muitos casais terminam não porque não se amam, mas porque a relação deixou de servir como espaço de vida compartilhada, deixou de ser útil para o desenvolvimento dos dois. Ou seja, o amor pode continuar existindo, mas se a funcionalidade se romper, a relação se torna insustentável.
Assim, ao invés de perguntar “meu relacionamento deu certo?”, a pergunta mais honesta seria: “até quando este relacionamento foi funcional para nós?”. Essa perspectiva desloca o julgamento moral, tira o peso da culpa e abre espaço para compreender que todas as relações têm um ciclo. Algumas duram meses, outras duram décadas, mas todas “dão certo” enquanto cumprem a função de unir, ensinar, nutrir e sustentar dois indivíduos em um projeto comum.
Comentários
Um assunto bastante discutido mas pouco entendido. Suas palavras são como de um psicólogo que procura compreender e orientar o seu cliente! Bravo!
Lorde Égamo | 04/09/2025 ás 12:52 Responder ComentáriosQuando passamos em frente a uma construção podemos perceber que na fachada tem uma placa com o nome do engenheiro responsável, mas quando a obra é concluída, uma das primeiras coisas que fazem é retirar aquela placa. Isto significa que o projeto foi concluído e não há mais nada a fazer ali. Por isso, não devemos entrar nem permanecer em um relacionamento sério sob pressão de fazer dar certo, O casamento, por exemplo, não estático, é circular, é dinâmico e, ao contrário do que a maioria pensa, se "der certo" acaba. Os casamentos que eram ‘um fim em si mesmo’ acabaram porque deram certo. Como assim? É isto mesmo, quando o casamento dá certo não há mais nada a fazer e aí começa a ficar monótono, sem graça, desinteressante e acaba, mesmo quando as pessoas continuam juntas. Se soubessem disso, as pessoas não entrariam em litígio, pois entenderiam que nada mais poderia ser feito e que não era uma questão de dar certo ou não, mas de funcionalidade.
Carlos Onkowe | 05/09/2025 ás 10:13Só o equilíbrio para resolver as variações que surgem em relacionamento!
Edson Bento | 04/09/2025 ás 14:53 Responder ComentáriosSim, o relacionamento funcional traz em seu bojo o equilíbrio. Podemos dizer que a ideia de equilíbrio nasce do gesto humano de observar uma balança. O fiel no centro, imóvel, representa a imagem que deu origem a essa palavra. Por isso, “equilíbrio” guarda uma relação direta com libra e, por extensão, com verbos como equilibrar e librar. Já “calibrar” surge mais tarde, quando o ser humano desenvolveu instrumentos de medição mais sofisticados. Ainda assim, a lógica permanece a mesma: buscar a justa medida. Daí afirmo que equilibrar é tão importante quanto calibrar. Um carro, por exemplo, quando está com os pneus devidamente calibrados, apresenta melhor desempenho e pode, inclusive, evitar acidentes.
Carlos Onkowe | 05/09/2025 ás 10:28Para entrar em um relacionamento, tem que ter muita equilíbrio emocional. Pois são dois mundos diferentes dividindo o mesmo espaço.
Rosilene Rodrigues Neves de Meneses | 05/09/2025 ás 10:41 Responder ComentáriosSim, o ideal seria termos tal controle. No entanto, é preciso considerar que o equilíbrio emocional, tão exigido pela sociedade, não é algo que possamos garantir nem em nós mesmos, muito menos no outro. Partindo do princípio de que não nos conhecemos por inteiro, é possível conviver dez, vinte ou quarenta anos com uma pessoa e, ainda assim, jamais conhecê-la completamente. Por isso, compreender o amor pela lógica da funcionalidade não o diminui. Pelo contrário, devolve-lhe a dignidade de processo humano, feito de encontros e desencontros, de permanências e rupturas.
Carlos Onkowe | 05/09/2025 ás 12:23