O Jogo

Contos | Valter Figueira
Publicado em 07 de Março de 2022 ás 09h 15min

Fazia quinze minutos que o jogo começou e os ânimos já tinham ultrapassados os limites normais. A raiva e o ódio invadiam a cabeça pequena e cheia de leis do pequeno doutor. Tinha acabado de cursar a faculdade, cinco anos de sofrimento. Agora se sentia imune e um insulto como aquele merecia uma resposta à altura. O lance, conhecido como carrinho, o derrubou acabando por perder a bola. Não era nada. Era apenas um jogo entre amigos. Mas não sabe por que, uma grande sede de vingança soou alto em seu subconsciente. Mas, não reagiria, não poderia. Haveria outra oportunidade e então...

A alegria foi total, quando numa jogada quase impossível, marcou o gol. Todos o cumprimentaram. Sentiu uma ponta de felicidade. Finalmente sentiu-se útil naquele lugar em que até aquele momento era um mero visitante, apesar de ser seu berço natal.

No intervalo a confraternização era geral, animados todos já afirmavam ter ganho o jogo. E assim sorridentes partiram para o segundo tempo. A ideia de vingança quase tinha se apagado de sua memória, quando num lance topa novamente com o sujeito e este avançava. Era o último homem, se não segurasse ele ficaria cara a cara com o goleiro e certamente marcaria o gol. O único jeito era derrubar e cometer uma falta.

Alguém no banco de reserva que estava atento a jogada gritou: "Mata a jogada"! Pensou e decidiu fazer isso mesmo. Além de não permitir que o outro marcasse o gol, poderia vingar-se. Então, num lance bruto, foi com os dois pés na perna do atacante que saiu esbravejando, dizendo que era um bruto e não sabia jogar. Foram aquelas palavras que soaram como um grave insulto a sua índole de advogado recém-formado. Irado foi até o outro que continuava sentado no gramado preparando-se para levantar. Sem dizer nada, desferiu um forte chute na região da mandíbula bem próximo ao pescoço. O indivíduo não aguentou e caiu inerte.

Advogado recém-formado, imune como se dizia, não poderia deixar que alguém o insultasse. Virou-se e foi embora gritando que não jogaria mais. Ninguém prestou atenção no que ele resmungava. E também ninguém ia continuar jogando, pois o rapaz acabava de falecer.

Talvez não tenha aprendido na faculdade que só pelo fato de ser advogado não era imune, ou talvez, não tenha entendido direito quando lhe disseram para matar a jogada e não o jogador.

 

Comentários

Que final surpreendente. Meus parabéns. Gostei muito. O texto foi muito bem escrito.

Paulinho Dhi Andrade | 07/03/2022 ás 15:06 Responder Comentários
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