O Ciclo e a Linha
Prosa Poética | Carlos Roberto RibeiroPublicado em 04 de Março de 2025 ás 17h 24min
A linha caminha, reta, rígida, sempre em frente. Olha para trás e nada encontra além do que já foi. O horizonte se estende, mas nunca se dobra, nunca abraça. A linha é uma sentença, um ponto de chegada sem retorno. Ela divide, separa, corta o espaço como uma lâmina fina. Quem a percorre só conhece um destino, e nele se perde, sem nunca saber de onde realmente veio.
Já o ciclo é dança, é redemoinho de maré, é abraço sem fim. Nele, cada fase é um recomeço, cada passo retorna ao ventre da origem, sem nunca ser o mesmo. O ciclo gira, convida, envolve. Nele, o tempo não é um cárcere, mas um fluxo. No ciclo, os encontros são inevitáveis, os processos são fecundos. O que parte, volta transformado, e o que chega, já esteve ali antes, de alguma forma, como um segredo sussurrado pelo vento.
A ciclicidade é a música do universo, a respiração da existência. Está na lua que cresce e mingua, no sangue que pulsa e retorna, na semente que se faz árvore e volta à terra. O cíclico é a certeza de que tudo renasce, de que nada se perde, apenas se refaz. A linha teme o tempo, teme o fim, pois só sabe seguir adiante. O ciclo, não. Ele compreende que todo fim é um novo começo e que nada realmente morre—apenas se transforma.
A linha impõe limites, o ciclo os dissolve. A linha corta o mundo em metades, em fronteiras, em margens que nunca se tocam. O ciclo, ao contrário, é comunhão, é o tambor que ressoa, é o sol e a lua que nunca se apagam, é o ventre da mãe que gesta e renova.
O universo é um ciclo, a vida é uma espiral. Só o pensamento insiste em ser linha, em negar-se ao retorno, em temer o eterno movimento. Mas quem aprende a girar, a aceitar a roda viva do tempo, encontra no ciclo um lar onde o fim e o começo dançam de mãos dadas, eternamente.