Meu final de semana, entre irmãos e abismos
Poemas | Dolores FlorPublicado em 11 de Maio de 2025 ás 19h 47min
Passei o fim de semana entre sombras e véus,
Com Dicke e seus filhos do silêncio cruel.
Jônatas, Lázaro — ecos de um tempo quebrado,
Na rede da culpa, o passado calado.
Machado sentou-se ao meu lado, irônico e só,
Com Paulo e Pedro debatendo um nó.
Dilemas sutis de um Brasil que tropeça,
Entre o voto, a herança e a promessa.
Saramago, sarcástico, me trouxe seu Caim,
Deus calava e a justiça fugia do fim.
Cada pedra atirada era uma pergunta nua,
O sangue da Terra gritava à lua.
Milton Hatoum me guiou pelos becos de Manaus,
Dois irmãos em guerra, ritos ancestrais.
O amor da mãe, a herança e a mágoa cravada,
Família partida, a alma rasgada.
Com Bauman, pensei num mundo que escorre,
Em que vínculos frágeis a ética socorre.
Consumidores de afetos, morais descartáveis,
Relações líquidas, desejos instáveis.
Adorno murmurou: “a barbárie persiste”,
Mesmo após a arte, o abismo resiste.
A cultura é campo minado de contradição,
Enquanto a razão trama a dominação.
Walter Benjamin soprou-me entre café e silêncio,
Falou do narrador, do tempo suspenso.
A experiência, dizia, é hoje ruína,
Mas dela, às vezes, brota a doutrina.
Bakhtin sorriu entre vozes dissonantes,
Polifonia em festa, discursos distantes.
A vida se forma em tensão e conflito,
Na palavra do outro, o mundo é redito.
E Bataille, estranho, trouxe o excesso e o sacrifício,
O erotismo e a morte — o último ofício.
No interdito, a verdade mais nua se diz:
De Caim a Abel, nenhum final é feliz.
Assim foi meu domingo: um altar de papel,
Com palavras que ardiam como fogo no céu.
Cada página, um espelho, um espinho, um irmão,
E no fim, só o livro segurando minha mão.
Comentários
Bárbaro! Fantástico! Não há como negar a eloquência disposta nesse maravilhoso poema cheio de nuances filosóficas e majestosas reflexões!
Lorde Égamo | 11/05/2025 ás 20:12 Responder Comentários