Luz da eternidade

Contos | Neiva Guarienti Pagno
Publicado em 06 de Março de 2023 ás 20h 58min

Era um número limitado de casas que formavam a singela Vila Vargas, onde moravam Eunice e Teresa, essa com cinco anos e aquela com sete. As duas pequeninas irmãs, filhas de Antônio e Lucinda.

A simpática comunidade acolhia poucos moradores e era constituída por apenas uma rua.

No lugar mais alto, a simples igrejinha preservava um ruidoso sino que, pontualmente às 8 horas de todos os domingos, convidava os habitantes do vilarejo para participarem da missa.

Do lado direito da igreja, um humilde pavilhão recepcionava as bucólicas festas promovidas pela comunidade e que recebia pessoas das vilas mais próximas.

Do lado esquerdo, a acanhada escolinha de duas salas de aula, uma cozinha, dois banheiros, um tímido jardim e um campinho de futebol de terra instruía as crianças do povoado.

 Ao final da minúscula vila, o pequenino cemitério hospedava algumas pessoas que já haviam morado no vilarejo, ou nas redondezas, e que agora dormiam para sempre.  

O cemitério era cuidado pela família de Eunice, que mantinha o espaço limpo, varrido, embelezado com lindas flores e algumas árvores de sombra.

Todos os dias, a menina Eunice, sua irmãzinha Teresa e seus pais tomavam conta do lugar, recebendo pelo serviço prestado à comunidade uma modesta gratificação, mas que ajudava a família a sobreviver com decência.

O cemitério sempre fora um lugar temido por inúmeras pessoas, porém as garotas Eunice e Teresa eram acostumadas com aquele recinto e, juntamente com os pais, zelavam com consideração e afeto, como se fosse o jardim de sua casa.

E era em Dia de Finados que as duas irmãzinhas se sentiam ainda mais úteis e atenciosas para com aquele lugar. Elas realizavam uma ação encantadora, que vinha do fundo dos seus corações, pois acreditavam que era preciso, de alguma maneira, fazer algo para confortar um pouco aquele dia tão triste.

Os seus avós, vizinhos e também os desconhecidos, que dormiam para todo o sempre no cemitério, recebiam dos seus entes queridos muitas velas e flores. As flores permaneciam coloridas, entretanto a maioria das velas se apagava com o vento.

Era aí que vinha o gesto surpreendente das duas meninas. Eunice e Teresa não deixavam que as velas se apagassem até que se consumissem por completo. Elas usavam pequenos rolinhos de papel confeccionados por elas próprias, retiravam o fogo das velas acesas e levavam-no até as velas apagadas.

Se alguma vela, por acaso fosse novamente apagada pelo vento, as duas meninas, incansavelmente, tornavam a acendê-la, até que todas as velas fossem totalmente queimadas.

Assim, Eunice e Teresa passavam a tarde inteira cuidando com apreço do lugar que estavam já acostumadas a zelar, acendendo as velas que se apagavam.

No simples gesto de compaixão, duas crianças traziam a luz da eternidade.

Comentários

Conto tão meigo e tão cheio de ternura!

ENOQUE GABRIEL | 07/03/2023 ás 09:04 Responder Comentários
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