Naquele ambiente gélido e acinzentado, o homem-relógio admirava a paisagem urbana uma última vez enquanto se preparava para finalmente ir embora. Em sua mente, destoavam-se memórias um tanto específicas, frivolidades, nunca antes chamadas de memoráveis, de súbito modo, haviam adquirido o poder fazê-lo hesitar.
Sua respiração, cada vez mais ofegante, aliada ao estridente vento frio, causavam-lhe a sensaçao de mil agulhas perfurando seus pulmões. De certa forma, a dor provocada pelo fôlego da vida já era uma sensação familiar, estava entranhada em seu cerne. Lembrava-o exatamente o porquê estava encarando os trilhos na beira da plataforma daquela estaçao de trem.
Desolado, seus olhos corriam por todas as direções daquele ambiente em profundo desespero tentando encontrar algo que o prendesse por mais alguns segundos naquele lugar. Infelizmente, esse esforço se revelava inútil a medida que cada elemento daquele espaço exalava uma indiferença brutal a fragilidade de sua existência. Em seu último impulso, entregue a imensidão, profere em sua mente seu último revés.
- Talvez eu nunca tenha sido um homem, por toda minha, sempre fui um objeto. Uma ampulheta.