Aquele havia sido um dia normal. Como de costume, muito trabalho no escritório. Mas já se passavam das onze horas da noite e Alceu ainda estava lá.
Um dia cheio. Pausa apenas para a hora do almoço e um gole e outro de café para dar uma distraída na cabeça.
De repente, Alceu sentiu uma forte dor de cabeça, que desceu para os ombros e se instalou na lombar. Os olhos ficaram nublados e uma grande fraqueza instalou-se em suas pernas. Uma moleza transpassou-lhe o corpo todo seguida de uma sensação de desmaio.
Era visto que o estresse estava nas alturas.
Num instante, Alceu sentiu-se flutuar e, tudo que experimentara, desapareceu. No entanto, um formigamento nas orelhas fez senti-las maiores que o normal. Em seguida, o formigamento foi para os olhos e também para o nariz. Alceu acreditava que estava ficando louco, porque os olhos e o nariz aumentavam levemente.
Alceu, um tanto esquivo, arrumou sua maleta e saiu cabisbaixo. Ainda havia alguns funcionários no escritório. Pegou o elevador e desceu até o estacionamento. Com as chaves na mão, ligou o carro e seguiu rumo para casa.
No caminho, o movimento do trânsito era intenso, embora fosse tarde.
Quando parou no semáforo, novamente o formigamento, mas agora na boca. E, ao contrário de antes, sentiu-a menor.
Quando o sinal abriu, Alceu acelerou para chegar logo.
Em casa, sua mulher dormia deitada no sofá. No quarto dos filhos, os dois meninos também caíam no sono.
Ao passar pelo espelho no corredor do apartamento, Alceu sentiu-se totalmente esdrúxulo: as orelhas, os olhos e o nariz estavam bem maiores do que o normal; já a boca, pequenininha. Sem entender o que estava acontecendo, tomou um banho bem demorado, vestiu pijama, foi para a cama, porém não dormiu a noite toda.
De manhã, assim que encontrou a mulher na cozinha, contou-lhe tudo o que havia acontecido na noite anterior. Acharam melhor procurar um médico.
O doutor Antônio, médico da família, realizou inúmeros exames em Alceu, e, ao final, constatou: Alceu não tinha nada. Era o estresse do dia a dia que o fez desenvolver tal anomalia no corpo.
Naquele dia, Alceu tomou a decisão mais correta da vida: pediu demissão, vendeu o apartamento e mudou-se com a família para uma casa na praia.
E quanto à anomalia? Alceu aprendeu que, nos dias atuais, olhar, ouvir e sentir trazem mais paz do que falar.