Entrelinhas do Acaso

O que dizer dos encontros inesperados? Esses fios sutis que se cruzam no tear da vida, sem aviso, sem roteiro, apenas acontecem. Surgem como quem não quer nada — às vezes brisa leve na curva de um dia comum, outras vezes, tempestade súbita que vem derrubando certezas e redesenhando destinos.

Têm, por vezes, o cheiro de livro antigo, o gosto doce de uma fruta madura, ou o som de uma risada que reverbera fundo, mesmo quando tudo lá dentro está quieto. Não chegam fazendo barulho. Entram de mansinho, como um olhar tímido que ainda não sabe que vai permanecer. Escorregam entre palavras soltas, atravessam as frestas da rotina e mudam tudo de lugar.

O tempo — velho alfaiate — vem, então, com dedos pacientes, costurando as possibilidades. Sem pressa, alinha o acaso aos detalhes, ponto por ponto, como se tudo tivesse sido feito sob medida, mesmo quando parece pura sorte.

E a gente, que jurava ter algum controle, se vê no improviso mais bonito. Como quem pisa no palco sem o texto decorado, mas encontra o tom certo na respiração do outro.

São encontros que não pedem licença, mas pedem abrigo. Não seguem regras, mas traçam caminhos invisíveis, que só se revelam depois — quando, olhando para trás, compreendemos os sinais.

Talvez seja isso: os encontros mais verdadeiros não se explicam — se sentem. São portas abertas em casas onde nunca estivemos, mas onde, de algum modo, o coração reconhece o chão.

E quando tudo parece finalmente fazer sentido, quando até o tempo parece sorrir com os olhos, percebemos que era exatamente isso que faltava para recomeçar. Ou talvez, quem sabe, seja apenas mais um capítulo… de uma história que ainda não sabemos nomear.

Prosa poetica. Rose Correia