BOLINHAS DE CINAMOMO

Poemas | Antologia Clube da Poesia e Declamação Gaúcha | CARLOS OMAR VILLELA GOMES
Publicado em 03 de Novembro de 2025 ás 16h 29min

BOLINHAS DE CINAMOMO

 

Eu comia bolinhas de cinamomo

E ruminava inquietudes...

Minhas bolitas de vidro pareciam astros gravitando na Via Chão...

Uma Via Láctea dos pobres, cheia de poeira não cósmica bem na frente da porta da frente.

Ali o mundo girava ao meu tranco...

Por vezes parelheiro, por vezes boi manso,

Mas sempre respeitando a dinâmica da minha lua.

 

Não havia entrelinhas nesses versos de improviso!

A alma era toda clara...ou toda escura...

Da cor exata de tudo que tinha e não tinha cor!

 

A minha funda campeava os ninhos dos passarinhos pelo prazer da caçada,

Mas eu era ruim de mira, e hoje agradeço a Deus!

Eu não chorava de dor nos tombos mais desastrados,

Se porventura uma cincha teimava em não se firmar...

Se porventura algum galho da ameixeira dos fundos

Vinha me chamar de gordo, quebrando e me dando um pealo

Num raro senso de humor.

 

Bolinhas de cinamomo eram meu lanche do contra

Nos contra-ataques da vida contra os tabus e morais.

Que gosto ruim tinha aquilo se desmanchando na boca!

Que gosto bom tinha aquilo quando a mãe saia braba já de chinelo na mão, Gritando: -Para guri, senão tu vai ficar louco!

Ela errava as chineladas e ia cansando aos poucos,

Até desviar a atenção...

 

Que bobagem, eu pensava...

E caia na risada disparando pro capão...

Mas hoje tenho na idéia

Que a brabeza da mãe “véia”

Talvez tivesse razão.

 

Que coisa sem serventia um guri solto no campo

Num folguedo de improviso...

Que coisa de fundamento um campo solto na alma

De um guri sem precisão!

Não é a toa que alguns chamam a sombra do cinamomo

De sombra do paraíso...

E eu tinha esse paraíso em frutos amarelidos

Tomando a palma da mão!

 

Tinha vezes que eu remoia, repensava, requetepensava,

 Aí desistia... pensar muito era muito cansativo...

Missão impossível pra um piá com uma cabeça oca

Louca pra ser recheada de mundo e vida.

Melhor era entrar na cozinha, como quem não quer nada

E garfear com uma colher o doce de leite ainda quente

Que a mãe tinha a ilusão que ia mandar pra vó.

 

Volta e meia eu olhava de longe numa árvore qualquer uma cachopa criada...

Os camoatins pela volta num zum zum tradicional...

Eu chegava despacito feito quem é transparente

E largava o taquaraço!

Era cachopa pra um lado, era cachopa pra o outro,

Era a taquara caindo, eu de maldade sorrindo

e no instante seguinte o enxame em cima de mim:

“Qual ia ser o meu fim?” Parafraseei o Dom Jayme...

Sempre era a sanga do fundo, do outro lado do arame!

 

Esse tipo de momento só tem uma explicação:

Bolinhas de Cinamomo comidas por gozação...

Qual é a graça e o enlevo

De ter quase um Martin Fierro

No couro, escrito a ferrão?

 

Assim foram esses dias... doces roubados,

Tombos ridículos, couro lanhado,

Muita patacoada e um peçuelo imenso

Recheado de recuerdos e saudades!

 

Hoje meu rosto é mais manso...

Já tordilho e bem rodado;

Somei algumas virtudes

Mais um lote de pecados...

Quatro filhos bem criados

E uns netos de Exposição!

 

Dou um sorriso pra dentro e chego à frente da casa

Numa sombra de plantão...

Abaixo, pego os frutinhos que vêem amarelinhos

O meu olhar de glutão...

E mais uma vez eu como

Bolinhas de cinamomo

Que trazem gosto de infância

E agora uma indigestão!

 

E pra terminar a história,

Dou a mão à palmatória...

 

 ...Mãe “véia” tinha razão!

 

 

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