Apolo

Contos | Sou Bichológico | Nicolas Rosa
Publicado em 21 de Janeiro de 2024 ás 21h 56min

Ele não deu nenhum sinal que seria um gato diferente dos outros. O adotamos quando uma gata de um prédio próximo teve ninhada. Seu nome inicial fora Minerva, pois achamos que ele era uma fêmea. Ele começou a se mostrar diferente já nisso aí: após alguns meses de crescimento, percebemos nele uma protuberância típica dos gatos machos. Então seu nome foi mudado para Apolo. O trabalho de cuidar dele acabou ficando para mim. Eu punha sua ração, primeiro a seca, depois a enlatada. Ele comia a maior parte da enlatada, e deixava parte da seca apodrecer, me forçando a limpar tudo no dia seguinte. A primeira coisa que fiz com ele foi um teste: comecei a fazer um assobio típico quando ia servir a comida dele. Depois fiz o assobio sem a comida. Ele veio. Nós morávamos no último andar é nós morávamos no último andar de um prédio de quatro andares. Eu desci com Apolo até o jardim do prédio e subi as escadas sem ele. Depois assobiei do alto da janela. Ele subiu os quatro andares sozinho e veio miando até nossa porta, que então abri para ele. Fiz isso para ensiná-lo a ir e voltar até a rua e me poupar o trabalho de ter que limpar uma caixa de areia, algo que meu irmão ia me deixar fazer sozinho. Em pouco tempo ele aprendeu a ir e voltar da rua sozinho, e isso acabou meio que se voltando contra mim: ele passou a ficar mais e mais dias na rua atrás de gatas e voltava todo ferido, brigando com os outros gatos. No começo tentei colocar band-aids nos ferimentos, sem sucesso, visto que ele grudava nos pelos. Acabei curando o gato apenas com soro, spray antisséptico, e um remédio antigo chamado fibrase, que eu também usava muito quando caía de bicicleta. O que acabou ocorrendo todas as vezes que ele ia para a rua, é que ele acabava usando nossa casa como uma espécie de entreposto. Ficava na rua o quanto queria, se feria todo e voltava para casa para se remendar apenas o suficiente para aguentar ficar na rua, e voltava para lá sem cerimônia. O treinamento que dei a Apolo foi eficiente o suficiente para ele tirar férias conosco. Uma vez ficamos abrigado no chalé no clube do meu pai, levamos o gato de carro junto. Soltei ele no mato do clube e ele ficou alguns dias se divertindo com os gatos locais até que eu chamei de novo. Houve um momento que minha família se separou, meu pai foi embora e nos mudamos para outro condomínio. A nossa renda não dava para pagar a ração especial que ele comia antes e o engraçado foi que ele percebeu: se antes ele deixa comia ração enlatada e deixava a ração seca de primeira qualidade apodrecer, quando ele percebeu que nós tínhamos apenas ração seca de segunda qualidade, ele viu que não ia ter mais do que isso e passou a comer a ração toda. Ele também tinha uma personalidade um tanto guerreira: ele apanhava de dois gatos maiores que tinham cada um capacidade de quebrar ele todinho. Houve uma ocasião que passou uma gata por ele e os dois gatos, e ele sem perceber que a gata estava prenha, brigou por ela. Os dois gatos preferiram ir embora a brigar com ele por algo que não tinha nem como ser ganho, dando a ele vitória por WO. Volta e meia ainda assim ele ainda brigava com os dois, ainda que fugindo no final todas as vezes. Quando estava no novo condomínio mantemos o esquema dele descer para do apartamento para a rua e da rua para casa, mas um dia ele simplesmente deixou de voltar. O procurei por todos os cantos e não achei. Minha mãe o deu por morto. Acabei achando melhor assim. Houve um gato que tempos depois eu realmente achei morto após ter comido veneno, e tive de enterrar. Tive outros gatos que sumiram. Acabei me contentando em criar gatos em apartamento, vendo o risco que correm os gatos que frequentam a rua. Porém, o gato que mais lembro ainda é do Apolo, o gato mais esperto que já vi.

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