As horas escorrem, líquidas e cegas,
num rio que não conhece margens.
São vértebras partidas, memória vazia,
ecos de silêncios que devoram o ar.
A manhã, com sua lâmina cega,
não corta o véu que o tempo teceu.
É uma promessa morna,
um grito abafado no pulmão do instante.
E, no entanto, o abismo chama.
Não há pouso para asas feridas,
nem terra firme sob os pés febris,
apenas o convite da queda.
Mas ouço, no fundo do escuro,
um som que não é de fim, mas de início.
Talvez o abismo seja ventre,
e o salto, um voo que ainda não sei.