(ode à minha infância)
O que somos, se não a soma de cada experiência vivida?
Cada pedacinho
Cada lembrança
Cheiros
Sabores
Pessoas
Amores
Quem somos à sombra dos cinamomos?
Era uma casa azul-clarinho
Era uma vida de passarinho
No Distrito de Colombo
Eu vivia bem mansinho
“Colomba”, meu eterno carinho!
A vida pacata do interior
O risoto fumegante da madrinha
Meus amigos e professores da escolinha
A saudade que há em mim não finda
Da minha primeira professora, Clarinda
Que exigente e atenciosa exercia sua profissão
Na tarefa de nos ensinar: a ela, minha gratidão!
Lembro das festas na comunidade
Da correria com a garotada
Ao redor da igrejinha.
Que saudade!
Sinto o aroma do churrasco assado
Em espetos de madeira preparado
A vida era plena
Livre de qualquer pecado.
A infância é sublime
Tempo de descoberta
De construção, de achado
Saudade...
Do mandolate
Do Mirabel
Dos temporais
Dos laranjais
Do pinhão
Dos parreirais
Das noites de serão
Esquecer? Jamais!!!
Da ameixa
Do caqui
Do filó
Do torresmo
Dos avós
Da geada nos quintais
Dos brinquedos artesanais
Caprichosamente feitos
Por meu querido padrinho
Vejo-o sereno, a sorver seu vinho...
Eu vivia como passarinho!
Tamanha saudade...!
Do caniço de taquara
De pescar no açude
Da madrinha, joia rara
Dos primos, dos tios
Do vento minuano
Dos rios
Da chimia no tacho
Da macarronada em família...
Guardo, da criança, a pureza
De Guaporé, a beleza
Das perdas, a sutileza
Da infância, a certeza,
É tempo majestoso, não volta mais
Tenho saudade dos vendavais
Que nos moldam, nos constroem
E encorajam a escalar montanhas
Para atingir nosso paraíso singular
E hoje, já adulto
Descubro que aquela montanha
Nada mais era que um mero barranco
Transformado em passagem secreta
Junto ao cinamomo, próximo do balanço
Por debaixo daquela videira
Passei minha infância inteira
Colhendo frutos deliciosos
Para saboreá-los agora
Sem pressa, aos bocados
Quando aperta, a saudade!
Sinto o cheiro da infância
Diante de mim ela se revela
Fechei a porta do passado
Entretanto, não a tranquei
Espreito-a quando há necessidade
De rever quem fui
Quem sou
E quem quero ser na vulnerabilidade
Da inconstância
Quem somos?
Lembrança?
Cada pedacinho
Infância!
Livro: A sombra dos cinamomos