A Pequena Peg

Infantil | 2025 - MAIO - Laços de família: Histórias de amor e conexão | Paulo Santana
Publicado em 27 de Março de 2025 ás 15h 36min

Peg era filha única, menina de interior que tinha a peculiar cobiça de conhecer a capital. Uma criança sonhadora, portanto, os recessos de sua mente viviam ocupados com histórias imaginárias e aventuras fantásticas que a ausentava da realidade. Peg sabia que na cidade grande as pessoas utilizavam telefone celular, queria conhecer a internet e devaneava apreciar todos os pontos turísticos citados em quase todos os livros que lera, os quais carregava consigo a todo instante, comprimidos em seu peito. Estava ansiosa para testemunhar o glamour que há nas grandes cidades, todavia, a beleza e elegância das mulheres com seus vestidos caros e bonitos. Fato que, por se tratar de uma criança, aguçava a curiosidade que vagava em sua perplexa mente infantil. Seu raciocínio era precoce, Peg tinha apenas nove anos, mas estava muito à frente das outras meninas da sua idade. Pois suas ideias estavam voltadas para o horizonte, fervorosamente influenciadas pela leitura, literatura, seus estudos e a um excêntrico estrangeirismo, dessa forma, por conta própria passou a chamar-se Peg porque havia descoberto que “Peggy” seria a abreviatura no inglês de Margarida, seu verdadeiro nome. Portanto, convenientemente respeitaremos o desejo de nossa inocente aspirante e ao longo dessa história a chamarmos apenas de Peg, ao invés de Margarida.

Certa vez, sua mãe que se chama Ana, recebeu uma carta da irmã mais nova, conhecida como Amanda que há alguns anos havia se deslocado para a capital no intuito de se formar. A missiva expunha seu desespero em conciliar a vida estudantil à dona-de-casa, pois tinha apenas vinte e dois anos e pouca experiência. Sendo assim, Ana ordenou sua irmã de nome Helena para ir à capital e apoiar a jovem em seus estudos e seu dia-a-dia.  Acontece que quando Peg soube desse acontecimento entrou em desespero, pois essa seria a sua grande oportunidade para realizar todos os seus desejos de felicidade, ela sabia que a experiência seria de alto valor e apostaria tudo nessa viagem, inclusive seus sonhos.

Peg foi até sua mãe oferecendo-se para acompanhar a tia na excursão, certificando-a de que seria de grande utilidade para ambas, pois sabia muito bem cuidar de uma casa e organizar uma faxina. O que era uma grande verdade por que ela sempre fora uma criança disciplinada. Sua mãe concordou em deixa-la ir sob a promessa de voltar imediatamente, caso se arrependa. Peg aquiesceu num lindo sorriso, pois tinha a mais absoluta certeza de que era aquilo que ansiava. Ficou combinado então que sua tia Helena a acompanhasse e obviamente seria a pessoa responsável pela sua integridade, uma vez que se tratava de uma criança de apenas nove anos recheada de desejos infantis.

No dia que antecedeu a viagem de sua vida, acordou com o habitual sorriso ao som da melodia agradável de pássaros em sua janela, o vento soprava o perfume das rosas de sua bem-cuidada sebe, enquanto ela, em seu desleixo matinal, bocejava espreguiçando-se na cama em contato com a aurora invernal. Era uma linda manhã, como todas as outras, sua felicidade estava ali, aquele era seu paraíso estável, ela sabia disso, mas precisava partir e ter a faculdade para distinguir os conceitos de felicidade. Ela precisava conhecer outros horizontes, a sua natureza a impulsionava, e isso a tornava excepcional. Havia no fundo de seu coração um desejo imenso em partir e deixar seu tesouro imensurável. Porém, estava segura de que a qualquer momento o poderia resgatar.

O grande dia chegou, Peg ouviu sua mãe explicar a tia que iriam em uma carroça até a extremidade da propriedade rural à margem do rio. De lá seguiriam em um pequeno barco até a estrada mais próxima, aonde passaria um “pau-de-arara” no qual seriam levadas a um ponto de onde seguiriam em direção a um grande terminal e um enorme e elegante ônibus seguiria com elas até a capital. Ficou esclarecido que todo o percalço duraria no máximo quinze horas de viagem. Após tomar conhecimento do itinerário, Peg hesitou, não que a grande distância a fizesse temer, mas evidenciava a extensão de seu sonho e o quanto a afastaria de sua felicidade. Valia apena tanto esforço para realizar um desejo e qual sua real necessidade?  Era necessário realmente colocar em risco sua zona de conforto em nome do glamour das grandes capitais? Ela não resistiu ao sentimento que interveio e delatou a sua convicção em relação a seus valores, seus ideais e suas raízes, pois inevitavelmente ainda era uma simples criança e precisava estabelecer as bases de suas estruturas para se tornar um adulto feliz.

Peg estava cheia de interrogações, elas haviam tomado o lugar de seus sonhos, não era medo, mas sim um receio e angústia acompanhada de desespero, sentia em seu coração que não deveria abandonar tudo aquilo que amava de fato, sua mãe, sua escola, as flores, os pássaros, a natureza em geral e sua aurora invernal. Era realmente esse sentimento que a diferenciava das outras crianças, seu discernimento atribuído a um consenso apropriado. Peg era a pessoa mais extraordinária de sua região, o alfa de sua constelação, uma menina que apesar de franzina e pequena, possuía um grande potencial, talvez atribuído a seu gosto peculiar pela leitura, associado a uma notável inteligência. Dessa forma chegou à conclusão de que poderia ser feliz em seu habitat e concluiu que nele havia as condições necessárias para o seu desenvolvimento. Como saber o que a vida reservara para ela? Peg simplesmente não tinha essa resposta. Sabia apenas que um dia haverá de se formar e obviamente destinará seus estudos à capital. A fantasia que a havia arrebatado não a envolveu, o grande desejo que outrora proporcionara um prazer inocente já não fazia mais sentido. Por esse motivo era uma criança admirável.  Peg virou-se de imediato para a tia que se encontrava tranquilamente sentada em um tronco de árvore a beira do caminho à espera do transporte e a informou em modos gentis: “querida tia Helena, é com imenso pesar que a notifico neste exato momento minha decisão de abandonar a viagem, assim como o receio de arrepender-me amargamente. Embora esteja familiarizada com a vida moderna e ansiosa para desbravar outros horizontes, a despeito de sua imponência, decidi abdicar meu desejo supremo. Comunique a minha prezada tia Amanda que eu desejaria de todo o coração fazer-lhe companhia, mas eu não posso abandonar as minhas raízes agora que sou tão pequena, pois minha mãe aprecia a minha companhia e representa um importante papel em minha vida”. Helena virou-se com espanto ao notar sua obstinação. A prevalência das crianças é uma dádiva, elas são imprevisíveis e possuem uma inocente liberdade. Contudo, a sobressaltada tia presenciou naquele momento a criatura mais determinada de sua vida, o que dotou seu coração de entendimento. Os sonhos e incertezas de se tornar a “Little peg” na capital se esvaíram, restando apenas a certeza de uma infância doce e feliz.

Comentários

Olá! Utilizamos cookies para oferecer melhor experiência, melhorar o desempenho, analisar como você interage em nosso site e personalizar conteúdo. Ao utilizar este site, você concorda com o uso de cookies.