MEL, meu coração está cheio de saudade...

Mas antes de falar de saudade, preciso lhe contar que a sua vinda nos trouxe algumas inquietações, e, por muito pouco, você não foi doada à outra família.

Quisera Deus que você fosse nossa! Você foi um presente, o melhor de todos, recebido de uma grande e querida amiga.

E você chegou em um domingo. E domingo, como todos sabem, tem gosto de sol quentinho e sabor de comida de mamãe. E foi em um final de tarde de um domingo de outubro, na primavera, que você chegou.

Seu nome já havia sido escolhido. Em homenagem à sua mãe e para harmonizar com a irmã mais velha, Meg, você foi chamada de Mel.

Um contraste e tanto com seu corpinho negro, sem nenhuma pintinha colorida sequer!

Tão pequenina, tão frágil, tão graciosa, apresentou-nos um mundo de alegrias.

Confesso que meu grande receio era que tipo de relação você desenvolveria com a Meg, até então, rainha absoluta da casa, há quase três anos.

Não poderia ter sido melhor! A Meg acolheu você de patinhas estendidas, e você fez dela gato e sapato! (Mas cá entre nós, a Meg adorava!)

Vocês realmente formavam uma dupla dinâmica, no melhor estilo Batman e Robin, só que com papéis invertidos, você era a sabedoria, Meg, a subserviência.

Era difícil resistir aos seus encantos, resistir a vontade de sempre tê-la no colo, de acarinhar seu corpo miúdo. Já pensou a ciumeira que isso causaria na Meg? Afinal, ela perdera o posto de bebê da casa!

Os dias foram passando... Você foi crescendo e ganhando vários pseudônimos: Sapequinha, Princesa, Rebolenta, Morceguinha, Buzuzu, Pretinha, Piquininha, todos fazendo jus às suas inúmeras facetas e à criatividade do papai com apelidos!

Como era bom acordar e abrir a porta dos fundos e ser recebido, diariamente, com festa. Não importavam a hora, o dia, o clima, ou qualquer outra coisa. Eram sempre momentos festivos! Como não se apaixonar?

E ao abrir o portão principal que dava para a rua, você saltitava como quem dizia “abra logo, quero dar minha volta, preciso explorar o mundo”. Sua alegria contagiante dissipava qualquer dia cansativo, na volta do trabalho.

Tomar o café da manhã em sua companhia era um ritual tibetano. Ao ganhar seu biscoito de água e sal, com seu corpinho esguio, imediatamente, você procurava o tapete mais próximo, para delicadamente saboreá-lo. Um encantamento, uma cena peculiar, digna de qualquer madame londrina sorvendo seu chá das cinco.

Você ensinou a Meg a virtude sublime de compartilhar: ração, biscoito, água, carinho, tapete, cama, afeto. Em casa de professores, você deu aula de bem (con)viver!

Até com canto lírico fomos agraciados: Meg e Mel, um assombro! Infelizmente não houve tempo hábil para o The Voice Dogs reverenciar essa dupla estelar!

Entre sua chegada e sua partida foram “apenas” 4 meses. Tempo suficiente para nos encher de amor.

Há fotos e vídeos que registram nossos grandes momentos, mas as melhores recordações estão gravadas em nossos corações.

Voltaria no tempo 1000 vezes para rever meu melhor presente. Daria um pote de ouro para admirar novamente seu focinho cheio de terra e os olhinhos negros e luzidios fitando-me inocentes “sou culpada, mas prometo não fazer mais” ao retornar da escavação no canteiro de hortaliças.

Fecho meus olhos e posso sentir seu cheirinho e sua patinha arranhando meu braço querendo atenção. Quantas vezes conversamos e nos compreendemos.

Não lhe vejo mais explorando cada cantinho da casa com seus passinhos de funkeira atrevida. Não há mais festa!

Você chegou em um domingo de sol quentinho e partiu em uma noite fria e chuvosa.

Sua passagem aqui foi breve e intensa. Sua vinda, aguardada; sua partida, inesperada; sua presença, muito amada!

A sua casinha vazia é um templo de saudade. Sua lembrança vivaz, amor para a eternidade!