A FAVELA

Contos | Artemise Galeno
Publicado em 10 de Fevereiro de 2025 ás 19h 21min

A FAVELA

O cenário era de dor.Uma criança acorrentada debaixo de uma mesa,como um animal, enquanto a mãe saía em busca de drogas.

O rostinho da menina, sujo pelas secreções que eram expelidas do nariz. Os cabelos ressecados e um olhar fixo no nada.Era uma criança de dez anos de idade.

Naquela favela, esquecida pelos governantes, Marina achava dificil criar uma menina num ambiente violento, e de uma forma errônea ela a deixava presa.Estava sendo autoritária do seu jeito. Ela sentia o perigo em volta e essa foi a única maneira de mantê-la dentro de casa.Marina morava na favela desde que conheceu seu marido.Ela sabia que ele estava envolvido com drogas e por muitas vezes o visitara na prisão. Era uma mulher sofrida e revoltada com a miséria que a assolava. Desde que engravidara viciou-se em cocaína e nao conseguiu fugir do vicio. Ela era criticada pela sociedade de uma maneira diferenciada. Quando estava grávida ninguem queria dar-lhe emprego.

Foi numa manhã de domingo que a mulher chegara e colocara comida no prato da menina. Jogava o prato perto como se fosse para um bicho.Tantas vezes fumava e soltava a fumaça perto da criança. Mesmo prisioneira, a menina ficava contente ao ver a mãe chegar com um pouco de alimento. Mas um dia ela sumiu e nunca mais voltou. Vizinhos encontraram a criança desnutrida debaixo da mesa.Um senhor que passava perto do casebre, escutou um gemido.Sem nenhum saneamento básico e sujeira na palafita,a vizinhança procurou a genitora, mas ninguem sabia de nada.

Vizinhos envolveram-se e ficaram com a criança, foi preciso levá-la na emergência, estava em choque,sem alimentar-se e sem água durante dois dias.

Por saber das coisas que aconteciam naquela palafita,um casal,ela aparentava ser bem mais velha, que estavam de malas prontas para o exterior, resolveram cuidar da menina. E não demorou muito para que a garotinha se recuperasse. O tempo passava rapidamente para Anita que estava crescendo e tornando-se uma adolescente muito bonita.

Era uma moça negra de cabelos crespos, os olhos escuros e belos. A senhora tudo fazia para vê-la sorrindo, mas o dono da casa, o senhor Antonio, tinha muito ciúme de Anita e a proibia que ela saísse de casa. Anita não gostava da maneira como ele a olhava e dava ordens a ela como se fosse uma empregada.Sua esposa não percebia a intenção do marido, porém Anita sofria ordens extremas daquele homem. Anita chorava escondido e queria sair daquela casa. Aquele homem estava cometendo violência contra uma menina. Despertara seu machismo e racismo na mesma probabilidade.Anita era uma vitima indefesa, ainda menina, tinha seus sonhos e perspectivas para viver bem. Sonhara ter seu apartamento e procurar sua mãe.Mas Anita sabia que era dificil o caminho porque ninguém se interessava pelo sumiço de uma negra.A violência sempre foi uma realidade naquela favela, pensou Anita.

A adolescente acordava cedo e apressada foi fazer o café. Na escola, conversava com suas amigas quando de repente, tropeçou em alguém. Era um jovem alto,olhar atraente e a garota ficou sem jeito. Ele a olhou de um jeito estranho. Parecia que a conhecia. Os dois se entreolharam e ficaram mudos, Anita conseguiu falar:

- Oh desculpe,fui culpada, derrubei seus cadernos!

- Não se preocupe,está tudo bem.

O jovem saiu olhando pra trás e ficou sorrindo sem nada mais falar.Anita ficou pensativa e a amiga perguntou:

- O que foi Anita, está no mundo da lua? Vamos conectar?

As duas amigas sorriram e Ligia falou:

- O nome dele é Marcelo.Está terminando Direito.Vai ser advogado.

Anita sorriu e disse:

-Bom saber.Parece um rapaz bacana!

-Ele é filho de gente que tem grana. Além de estudioso é inteligente...

- Para Ligia!! não quero saber nada sobre ele.

-Por quê?

-Ah... você entendeu. Eu sou negra e gente como ele, não vai quer nada comigo.

-Para com isso menina! ele não tem preconceito.

As duas amigas se despediram e foram pra casa.

Anita entrou devagar quando foi surpreendida pelo senhor Antonio:

-Hora essa de chegar? vá pra cozinha negrinha!

Anita estava disposta a contar tudo para a idosa, mas planejou fugir. Iria morar com sua amiga. Assim, depois da janta, se recolheu e se despediu da idosa com carinho. De madrugada, entrou no quarto do casal com passos leves, quando de repente uma mão forte segurou em seus braços e a domou. Anita ainda conseguiu arranhá-lo no rosto. Empurrando-lhe,imaginou que a chave estivesse na cama e pegou debaixo do travesseiro.  Correndo conseguiu abrir o portão. Era hora de ser livre! Depois de dois dias na casa da amiga, o toque da sirene a fez despertar. Ligia foi abrir a porta e o rapaz entrou.

A jovem não acreditou quando ele estava em sua frente.Era Marcelo. Anita ficou nervosa e não queria que Marcelo a visse daquele jeito,desarrumada.Mas ele a deixou á vontade.

Finalmente os jovens ficaram amigos e todas as noites eles ficavam conversando. Anita contava suas dores para seus amigos e confessou o que o senhor Antonio fazia com ela. Marcelo ficou muito chateado e o denunciou.Ele não poderia ficar impune. Para isso, existe a Delegacia da mulher. e tantas fontes que se pode denunciar. Declarou Marcelo revoltado. Anita teve muito medo,mas confessou todos os detalhes ao policial.

Nada pode tornar-se natural quando existe uma ação errada e deve ser mudada. O homem foi preso.Marcelo e as amigas descobriram por fim que a mãe de Anita foi morta pelo marido depois de tê-lo traído. Marcelo estava fazendo sua Faculdade de Direito e Anita estava esperando o resultado do vestibular.

-Anita, vem aqui! Tenho uma surpresa pra você. -Falou Marcelo.

O jovem mostra o celular e abre um aplicativo onde há uma relaçao nominal, e ele diz:

Parabens Anita Duarte, você foi aprovada no Vestibular de Direito!

Anita náo sabia se sorria ou se chorava. Era ela aquela menina amarrada numa mesa, filha de uma negra.Logo estaria exercendo um papel de mulher forte,fortalecendo sua autoestima.Ocuparia um espaço importante na sociedade. Com ajuda de Marcelo, finalmente la eteve uma direção e soube se defender e aproveitar seus estudos para vencer na vida. 

Marcelo conquistou com seu jeito doce e enfrentou a familia para ficar com ela. Anita já não se importa de ser chamada de negrinha.A jovem superou obstáculos diante de um cenário caótico.E são as muitas Anitas da vida que podem e sabem fazer a diferença.

Artemise Galleno

 

Comentários

Homem já pode chorar? ainda não? e poeta pode? pois é, eu chorei diante desta obra tão bem feita e repleta de emoção! Parabéns, Artemise Galeno!

Lorde Égamo | 11/02/2025 ás 16:03 Responder Comentários
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