Sinopse:

Em uma noite fria de junho, a biblioteca se transforma sem alterar sua forma. As palavras despertam, não para o ruído, mas para o encontro silencioso que acontece quando a linguagem se reconhece. Entre estantes, memória e permanência, o texto reflete sobre a força da comunhão, capaz de aquecer mesmo quando o frio insiste. Um olhar poético sobre o que permanece intacto quando tudo ao redor parece se mover.

A Biblioteca Não Mudou 

A biblioteca resolveu dar uma festa.

Não de ruídos, mas de presença.

As letras, inquietas, sentiam o anúncio no ar.

Era junho.

O vento frio atravessava as frestas, movia as prateleiras

e tocava, com igual rigor, o íntimo das palavras.

Os enfeites — discretos, múltiplos —

rompiam a sobriedade do espaço como um arco de cor

no meio da contenção.

Entre estantes antigas, onde o silêncio é regra,

as palavras despertaram.

Não para brincar,

mas para lembrar que existem além da espera.

Os livros, alinhados pelo tempo,

guardavam histórias em estado de vigília.

Cada página parecia mais alerta,

como se o papel reconhecesse o instante raro

em que não era apenas suporte,

mas encontro.

Havia no ar o cheiro da memória:

papel, poeira, permanência.

As palavras deixaram o repouso

e ocuparam o espaço —

não em festa ruidosa,

mas em comunhão.

Mesmo quando o frio se fazia presente,

a harmonia e a sintonia aqueciam quem desejasse,

nem que fosse por um instante apenas,

sentir o calor que nasce da escuta.

Naquela noite de junho,

a biblioteca não mudou de forma,

mas de estado.

Continuou sendo abrigo de saber,

agora também atravessada

pela certeza silenciosa

de que as palavras, quando reunidas,

sustentam o que o frio não alcança.

Por: Rose Correia